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Crónica do Espectador Fantasma (2)

De facto, organizar eventos de qualquer espécie revela-se cada vez mais um empreendimento desesperante. Sobretudo se tal evento for de índole recreativa/cultural, dado a inexistência de quaisquer interesses ou apoios institucionais ou governamentais que parecem permear os tempos pandémicos presentes e vindouros. É seguro então apelidar a 26ª edição do Festival Caminhos do Cinema Português como um autêntico milagre pelejante. Não somente devido à perseverança da sua organização em concretizar o escopo anual a que nos habituaram, mas sobretudo pelas suas vitórias improváveis –muitos chamariam impossíveis – que se prestaram a realizar este ano, contra todas as expectativas. Tal ribalta incide-se na ressurreição da Sala 2 das Galerias Avenida. Embora tal espaço já se encontrasse abandonado há mais de uma década, com os Caminhos deste 2020, a tela voltou a ter (e a exibir) movimento, bem como a reunir um público regular à sua frente, numa atitude louvável e contra-corrente às tendências comerciais, dados os notórios encerramentos das salas de exibição por esse mundo fora.

Tal carácter excepcional não se estranha nos Caminhos, que este ano arredam passo e prosseguem na expectativa de trilhar (ao invés de meramente iluminar) novas paisagens no panorama cultural da cidade de Coimbra e, por conseguinte, no nosso país. Além das variadas sessões cinematográficas de teor competitivo ou dialéctico, os cenários adjacentes aos Caminhos também se dinamizam pelas suas facetas ilustrativas, manifestadas em duas exposições de teor artístico. A mostra “Cartazes do Cinema Português” nas Galerias Avenida, providenciam um vislumbre retrospectivo no que diz respeito à nostalgia iconográfica dos posters de filmes portugueses. Já a exposição “Trabalho de Actor / Trabalho de Actriz”, situada na estação tradicional do Festival que é o Teatro Académico Gil Vicente, põe em primeiro plano os perfis dos intérpretes das películas portuguesas, num manifesto apreço pelos bastidores da representação, tal qual o documentário homónimo de João Canijo sobre o seu filme “Sangue do Meu Sangue”.

Neste afirmar de vicissitudes rebeldes mas necessárias para espevitar o cinema nacional, os Caminhos em 2020 trilham-se pois à cadência de sons de rebeldia para combater as dissonâncias culturais. Desde os acordes iniciais das Warm-Up Sessions (centradas em documentários do rock nacional como “Um Punk Chamado Ribas” e “Zé Pedro Rock’n’Roll”) à cerimónia de encerramento agendada para hoje com os The Twist Connection.

Pedro Nora

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