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Crónica do Espectador Fantasma (1)

É precisamente enquanto recompensa por tal atitude de fé e comunhão perante o grande ecrã que o Festival Caminhos este ano apresenta a sua programação sui generis, dividindo-se cada vez mais em trilhos distintos e algo distantes (quer em espaço como em tempo, justificando assim o aumento calendarizado do Caminhos para um mês, ao invés de uma semana), de modo a celebrar o cinema nacional sem aglomerados caóticos. Assim, às tradicionais secções competitivas como a Selecção Caminhos e Outros Olhares juntam-se novas vertentes paralelas como Intervenção! e Filmes do Mundo que, abordando respectivamente controvérsias sociais ou visões longínquas, exploram a reciprocidade dialéctica inerente a uma audiência emancipada. De facto, a sobrevivência da 7ª arte passa por uma via de duplo sentido, sendo-lhe impossível evoluir somente com o modelo simplista e consumista de emissão e recepção a que as plataformas de serviços audiovisuais a pedido actualmente intentam reduzir.

Aliás, e retomando a cariz competitiva dos Caminhos descrita acima, salienta-se que um dos louvores atribuídos no final do Festival (o tradicional Prémio CHAMA Amarela) é ditado pela classificação do próprio público. Como tal, a posição do espectador revela-se sempre como uma figura de importância fulcral para o cinema nacional e sobretudo para este Festival que o celebra. No entanto, do outro lado da tela, a criatividade autoral não se descura. Bem pelo contrário, a originalidade dos artesãos cinematográficos de Portugal expõe-se em primeiro plano, com a presença de convidados ilustres como realizadores e actores que permitem ao público desvendar curiosidades sobre os bastidores da magia cinematográfica, através de conversas pós-sessões entre cineastas e cinéfilos. É pois, por entre variados géneros e formas de narrar histórias ou vivenciar experiências fílmicas, que o catálogo do Caminhos este ano se apresenta como a súmula do melhor que se faz na autoria cinematográfica nacional. 

Nas longas-metragens, o grande destaque irá certamente para “Listen” de Ana Rocha, filme já galardoado nos circuitos internacionais e entretanto anunciado como o candidato nacional aos Óscares do próximo ano. Mas trata-se apenas de um dos exemplos mais mediáticos de uma extensa e diversa lista de filmes que conta não só com variados regressos mas sobretudo por estreias promissoras. Neste campo, pudemos vislumbrar não apenas as novas vozes por detrás das câmaras na cinematografia nacional, como Basil da Cunha com “O Fim do Mundo” ou o actor Gonçalo Waddington que assina “Patrick”, mas também experienciar estreias nacionais de longas-metragens como “Lost Records” de Tiago P. Carvalho ou “Aos Nossos Filhos”, o novo filme de Maria de Medeiros. Bons motivos para apoiar o cinema nacional, que se mostra assim como um farol de esperança em tempos culturalmente lúgubres.

Pedro Nora

 

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